É um colega daqueles amigos que partilha comigo segredos da empresa, histórias e fotografias das viagens que vai fazendo, com quem partilho em primeira-mão uma promoção, a quem peço boleia quando por algum motivo estou sem carro.
Um colega daqueles amigos que partilha comigo os flirts que vai tendo, uns mais evidentes que outros.
Soube ao final da tarde que na terça-feira dia de Carnaval, a mulher, a paciente e amorosa mulher, lhe pediu o divórcio.
Cansada, aproveitou o dia em que as pessoas se mascaram para tirar a dela que já não lhe servia e anunciou que se prepara para viver um novo amor, ao lado de um homem que a olhou, a cativou, por quem perdidamente se apaixonou e que é agora tempo de arrumar um casamento de quinze anos que já não faz mais sentido.
«E agora como é que eu vou dar o beijo de boa noite aos miúdos?»
«Pois não vais»
E não vais ter o jantar na mesa se não o fizeres, nem a roupa no roupeiro se não te lembrares de passar na lavandaria. Nem a casa aquecida e a cama quente quando chegares tarde.
«Ela devolveu as flores que lhe mandei»
«Eu também devolveria»
E está a devolver-te num só gesto tudo o que carregou em silêncio nas tuas ausências, nas tuas arrogâncias, nas tuas crueldades.
«E o outro diz que vai apresentar queixa por causa das ameaças que lhe fiz»
«E eu apoiaria»
E depois disso vai pegar na mão da tua dele mulher e dizer o que há muito te esqueceste que ela gostava de ouvir.
Se eu soubesse tinha-te dado a ler a crónica do António Lobo Antunes.
Azar meu querido colega amigo, azar!
[…] Um azar nunca vem só. […]